Polêmica ou ignorância? – Do blog marcosbagno.com.br

Prezados,

Transcrevo abaixo post copiado do blog do Prof. Marcos Bagno, da Universidade de Brasília. No final, há um comentário meu, que ainda aguardava moderação no momento em que copiei a página.

Esclareço que não possuo formação acadêmica em linguística, porém possuo conhecimento e formação suficiente para compreender totalmente o exposto pelo Prof. Bagno, cuja corrente de pensamento e trabalho conheço há tempos. Isto posto, cumpre  notar que NÃO concordo com suas opiniões e com sua linha de trabalho. Apesar de compreender as diferenças entre linguística e gramática, creio que o trabalho em questão, de Heloísa Ramos – “Por uma Vida Melhor”, não ajudará os que a receberam a compreender realmente esta diferença, abrindo caminho para que assumam o “inapropriado” como sendo “aceitável”, o que pode levá-los a não progredir em seu crescimento educacional pessoal. Nisto consiste meu “óbice” a esta obra e à forma como o MEC trata o assunto.

Mas leiam a trascrição do Prof. Bagno, e se for preciso, conheçam o seu trabalho em seu blog.

Em seguida, postarei uma opinião sobre o assunto publicada na Folha de São Paulo, com alguns comentários, para dar sustentação à nossa discussão.

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Blog do Prof. Marcos Bagno.

Blog do Prof. Marcos Bagno.

 

POLÊMICA OU IGNORÂNCIA?

DISCUSSÃO SOBRE LIVRO DIDÁTICO SÓ REVELA IGNORÂNCIA DA GRANDE IMPRENSA

Marcos Bagno
Universidade de Brasília

Para surpresa de ninguém, a coisa se repetiu. A grande imprensa brasileira mais uma vez exibiu sua ampla e larga ignorância a respeito do que se faz hoje no mundo acadêmico e no universo da educação no campo do ensino de língua.
Jornalistas desinformados abrem um livro didático, leem metade de meia páginae saem falando coisas que depõem sempre muito mais contra eles mesmos doque eles mesmos pensam (se é que pensam nisso, prepotentementeconvencidos que são, quase todos, de que detêm o absoluto poder da informação).
Polêmica? Por que polêmica, meus senhores e minhas senhoras? Já faz mais de quinze anos que os livros didáticos de língua portuguesa disponíveis no mercado e avaliados e aprovados pelo Ministério da Educação abordam o tema da variação linguística e do seu tratamento em sala de aula. Não é coisa de petista, fiquem tranquilas senhoras comentaristas políticas da televisão brasileira e seus colegas explanadores do óbvio.
Já no governo FHC, sob a gestão do ministro Paulo Renato, os livros didáticos de português avaliados pelo MEC começavam a abordar os fenômenos da variação linguística, o caráter inevitavelmente heterogêneo de qualquer língua viva falada no mundo, a mudança irreprimível que transformou, tem transformado, transforma e transformará qualquer idioma usado por uma comunidade humana. Somente com uma abordagem assim as alunas e os alunos provenientes das chamadas “classes populares” poderão se reconhecer no material didático e não se sentir alvo de zombaria e preconceito. E, é claro, com a chegada ao magistério de docentes provenientes cada vez mais dessas mesmas “classes populares”, esses mesmos profissionais entenderão que seu modo de falar, e o de seus aprendizes, não é feio, nem errado, nem tosco, é apenas uma língua diferente daquela – devidamente fossilizada e conservada em formol – que a tradição normativa tenta preservar a ferro e fogo, principalmente nos últimos tempos, com a chegada aos novos meios de comunicação de pseudoespecialistas que, amparados em tecnologias inovadoras, tentam vender um peixe gramatiqueiro para lá de podre.
Enquanto não se reconhecer a especificidade do português brasileiro dentro doconjunto de línguas derivadas do português quinhentista transplantados para as colônias, enquanto não se reconhecer que o português brasileiro é uma língua em si, com gramática própria, diferente da do português europeu, teremos de conviver com essas situações no mínimo patéticas.
A principal característica dos discursos marcadamente ideologizados (sejam eles da direita ou da esquerda) é a impossibilidade de ver as coisas em perspectiva contínua, em redes complexas de elementos que se cruzam e entrecruzam, em ciclos constantes. Nesses discursos só existe o preto e o branco, o masculino e o feminino, o mocinho e o bandido, o certo e o errado e por aí vai.
Darwin nunca disse em nenhum lugar de seus escritos que “o homem vem do macaco”. Ele disse, sim, que humanos e demais primatas deviam ter se originado de um ancestral comum. Mas essa visão mais sofisticada não interessava ao fundamentalismo religioso que precisava de um lema distorcido como “o homem vem do macaco” para empreender sua campanha obscurantista, que permanece em voga até hoje (inclusive no discurso da candidata azul disfarçada de verde à presidência da República no ano passado).
Da mesma forma, nenhum linguista sério, brasileiro ou estrangeiro, jamais disse ou escreveu que os estudantes usuários de variedades linguísticas mais distantes das normas urbanas de prestígio deveriam permanecer ali, fechados em sua comunidade, em sua cultura e em sua língua. O que esses profissionais vêm tentando fazer as pessoas entenderem é que defender uma coisa nãosignifica automaticamente combater a outra. Defender o respeito à variedade linguística dos estudantes não significa que não cabe à escola introduzi-los aomundo da cultura letrada e aos discursos que ela aciona. Cabe à escola ensinar aos alunos o que eles não sabem! Parece óbvio, mas é preciso repetir isso a todo momento.
Não é preciso ensinar nenhum brasileiro a dizer “isso é para mim tomar?”, porque essa regra gramatical (sim, caros leigos, é uma regra gramatical) já faz parte da língua materna de 99% dos nossos compatriotas. O que é preciso ensinar é a forma “isso é para eu tomar?”, porque ela não faz parte da gramática da maioria dos falantes de português brasileiro, mas por ainda servir de arame farpado entre os que falam “certo” e os que falam “errado”, é dever da escola apresentar essa outra regra aos alunos, de modo que eles – se julgarem pertinente, adequado e necessário – possam vir a usá-la TAMBÉM. O problema da ideologia purista é esse também. Seus defensores não conseguem admitir que tanto faz dizer assisti o filme quanto assiti ao filme, que a palavra óculos pode ser usada tanto no singular (o óculos, como dizem 101% dos brasileiros) quanto no plural (os óculos, como dizem dois ou três gatos pingados).
O mais divertido (para mim, pelo menos, talvez por um pouco de masoquismo) é ver os mesmos defensores da suposta “língua certa”, no exato momento em quea defendem, empregar regras linguísticas que a tradição normativa que eles acham que defendem rejeitaria imediatamente. Pois ontem, vendo o Jornal das Dez, da GloboNews, ouvi da boca do sr. Carlos Monforte essa deliciosa pergunta: “Como é que fica então as concordâncias?”. Ora, sr. Monforte, eu lhe devolvo a pergunta: “E as concordâncias, como é que ficam então?

Não há respostas. para “Polêmica ou ignorância?”

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Compreendo que a gramática atual tenha criado novas formas de aceitar o “popular” como regra. Quando 2 ou 3 gatos pingados dizem “os óculos”, apesar de estarem de acordo com a “norma culta”, podem ser alvo de preconceito invertido, sendo chamados de “gatos pingados”, como se diminuí-los quantitativamente pudesse desmerecê-los? Não estaria o Senhor e todas estas “regras gramaticais” promovendo o desserviço de dizer às pessoas que elas não precisam de correção ou educação de qualidade, mas sim que a língua é que precisa ser corrigida para se adequar a elas? Então os mais de 80% da população brasileira que o MEC nunca alcançou agora estariam sendo alcançados, não pela educação formal, mas por um instrumento que diz que eles é que estão certos, promovendo uma “variação linguística” cujo berço é o próprio analfabetismo, responsabilidade deles, MEC? Me parece, sinceramente, que trata-se de tornar mais fácil a solução de um problema que poderia ser gigantesco: Ao invés de fornecer educação de qualidade a todos os que têm esse direito, digo aos “gatos pingados” que usufruíram deste direito, sejam quais forem as circunstâncias que os possibilitaram, que eles é que estão errados em sentirem “dores nos ouvidos” ao serem expostos à frases do tipo “isso é para mim tomar?”? Vamos então esquecer tudo o que aprendemos na escola, os gatos pingados que tiveram oportunidade de frequentar uma, e abraçar alegremente esta forma absolutamente “inculta” de se expressar, pois caso contrário, somos “preconceituosos” e “discriminadores”?
Desculpe mesmo, de coração, mas prefiro continuar minha militância de sempre, no sentido de buscar instrumentos para que todos tenham respeitados e garantidos os seus direitos, dentre eles um em especial: Educação.
Ainda acredito que fornecer educação de qualidade para a nação pode promover mudanças positivas, enquanto que “aceitar” as coisas “como estão” promove apenas a continuidade. E sinceramente, não vejo em nosso país hoje muitas razões para desejar “continuidade”.
Obrigado pela oportunidade. Certamente deve haver “inapropriações” gramaticais em minha participação, e gostaria de vê-las apontadas, para que tenha a oportunidade de torná-las mais “apropriadas”.
Interlocutor – Coisa Pública.

http://marcosbagno.com.br/site/?page_id=745&cpage=1#comment-960

 



Sobre Interlocutor

Cidadão brasileiro, gostaria de ver os Contratos Sociais serem efetivamente cumpridos e as riquezas desta grande nação retornarem em benefícios a todos os signatários dos Contratos Sociais. Áreas de interesse: Educação, Política, Sociologia e Direito.